segunda-feira, 31 de dezembro de 2012

O Segredo Dos Seus Olhos



Para quem achava que o cinema americano, inglês e francês era sinônimo de qualidade e as películas gerais (em especial as sul-americanas) eram fracas, toda regra tem a sua exceção. Digo isso porque é verdade, tem muito pseudocinéfilo por aí, que diz que cinema é o de Godard, o de Kurosawa (que não se encaixa em nenhuma das nacionalidades citadas acima mas, vai lá) e despreza produções que deveriam receber um maior destaque.
Na Índia, por exemplo, encontramos um filme lindíssimo que me surpreendeu nos últimos dias, o "Como Pequenas Estrelas Na Terra" (ou, "Somos Todos Diferentes").
Até no Brasil, podemos ver que as produções têm melhorado, como "Tropa de Elite 2: O Inimigo Agora É Outro", "Heleno", "Reis e Ratos", "2 Coelhos" e outros aí, que embora não sejam filmes perfeitos, demonstram uma incrível evolução do cinema nacional.
Mas não estou aqui para falar da falta de valorização ou divulgação de filmes desconhecidos. Estou aqui para falar de uma pérola do cinema argentino que foi sim reconhecida, que levou o Oscar de Melhor Filme Estrangeiro em 2010 e que deveria ter sido melhor divulgada aqui no Brasil.
Essa pérola, chama-se O Segredo Dos Seus Olhos. Um daqueles filmes bonitos, emocionantes, que surgem raramente, um acerto em mil.
Na trama, Benjamín Espósito (Ricardo Darín) acaba de se aposentar como funcionário público da justiça penal argentina e resolve escrever um livro sobre um crime que investigou. Ele, então, volta a conviver com alguns personagens do fato ocorrido 25 anos antes.
A trama, baseada no argumento de Eduardo SacheriJuan José Campanella é seca, humana, cruel, pesada. Acima de tudo, é uma história sobre o homem, sobre suas paixões. Incrível como o diretor Campanella consegue unir crime, mistério, romance e até humor durante os 130 minutos da película, que passam como se fossem 10.
O personagem de Darín vive no passado, vive de lembranças. Memórias de perdas, de amores terminados, de mistérios inconclusos. Quando resolve escrever o tal romance, é uma maneira de voltar àquilo que sempre o pertubou, que o sempre impediu de viver. Enquanto vai escrevendo seu livro e revisitando as memórias por meio de flashbacks, vamos vendo a magnitude de um filme relativamente simples, sem efeitos especiais, urbano, pacato mas grandioso. Ao invés das correrias, tiroteios e perseguições dos filmes policiais comuns aqui temos muito diálogo, sempre grandioso e coerente.
A fotografia é belíssima e dá espaço à mais bela cena de perseguição que já vi num filme. Aliás, não só à perseguição, mas a sequência em si é linda. O modo como a câmera percorre o estádio de futebol, o chute quase certeiro, a reação da torcida, os closes atrás do assassino. Tudo feito com profissionalismo, de um modo que o nosso caro José Padilha também sabe fazer com maestria.
Os atores são muito bons. É lindo ver como os personagens amadurecem e mudam (não só fisicamente) durante os 25 anos que se passam. O romance de Benjamin com Irene Hastings (Soledad Villamil) é igualmente fascinante. É um romance calado, sofrido. Sabemos que ele existe, mas não o porquê de não florescer. Muito bom!
Outro papel que chama a atenção é o do grande Guillermo Francella, interpretando Sandoval, o carismático (e alcóolatra!) amigo de Benjamin, que serve como alívio cômico do filme e que desenvolve um grande exemplo de amizade durante a película. Vê-los juntos é sempre divertido!
O roteiro - ou melhor, a trama em si - é com certeza o ponto mais forte do filme. Como eu citei antes, mostra o lado humano dos personagens, frio, cru. Algumas vezes, são as cenas que chocam, outras os diálogos ou as ações dos personagens. Tudo aqui parece real e ao mesmo tempo lírico. É emocionante acompanhar toda a história, que vai muito além de um drama policial.
Certamente um dos melhores filmes dos últimos anos e um bom representante do bom cinema latino-americano (foi o terceiro filme latino-americano a receber o Oscar de melhor filme estrangeiro, sendo o primeiro o brasileiro "Orfeu Negro" e o segundo o também argentino "La historia oficial"), O Segredo Dos Seus Olhos é certamente uma grata surpresa. Por falar em surpresa, não existem palavras para descrever o final surpreendente do filme, daqueles que te fazem ir dormir pensando e meditando, tentando entender. Imperdível!

NOTA MECÂNICA: 9,0

sábado, 29 de dezembro de 2012

Assassinato em Gorsford Park



Um casarão. Hóspedes ricaços, esnobes e falsos. Um anfitrião odiado por todos aparece assassinado. Alguém daquela casa o envenenou e logo depois cravou uma faca em seu peito. Quem será o assassino?
Isso poderia muito bem ser a trama de um livro de Agatha Christie, não é mesmo? Em Assassinato em Gosford Park, tudo lembra os livros da escritora inglesa, menos a qualidade.
Quem leu livros como E Não Sobrou Nenhum (publicado anteriormente como "O Caso dos Dez Negrinhos"), Assassinato no Expresso do Oriente e É Fácil Matar, está acostumado com esse tipo de trama, em que várias pessoas estão confinadas em um local, ocorre um crime e uma delas foi o assassino, nos levando a acompanhar tudo, numa espécie de "BBB macabro".
O filme em questão nesta crítica, se inspira nos mais diversos livros de Christie para criar uma trama própria que por si só é fraca, incoesa e desinteressante.
O modelo em si, já muito utilizado no cinema (parece que filmes assim são lançados todo ano) não consegue ficar batido, em minha humilde opinião. Adoro filmes como O Vingador Invisível (excelente adaptação do já citado livro E Não Sobrou Nenhum) e O Anjo Exterminador, por exemplo, mas Gosford Park chega a ser decepcionante!
O filme inicialmente tem a pretensão de parecer uma novela inglesa. Durante 60 minutos vemos umas dezenas de personagens sem-graça, uns com profundidade outros não, jogados em um casarão. Fofoca vai, fofoca vem. Nada parece ter sentido, apenas que são pessoas esnobes (no caso dos ricaços) e outras conspiradoras (os criados, em sua maioria). Não consegue-se criar simpatia com nenhum dos personagens, e olha que o elenco tem umas estrelinhas com Clive Owen, Ryan PhillippeMaggie Smith, Kelly Macdonald, Michael Gambon e Hellen Mirren. Todos misteriosos, mas nada interessante. Na primeira metade do filme, há um clima de novela inglesa, e confesso que acompanhei tudo com muito desinteresse, nada me chamava a atenção. Então, lá pra metade da película, ocorre o assassinato que estraga a surpresa do filme na tradução brasileira (a versão original chama-se apenas "Gosford Park").
Você então vê-se numa obra de Christie e pensa "caramba, vou prestar atenção em todos os detalhes, porque sei que no final haverá uma revelação incrível, que me fará ficar dias pensando no filme". Balela! A pessoa que assassina o Sir William McCordle (Michael Gambon) é justamente - spoiler a frente - a última pessoa vista com ele! Simples, não?
E então entra na trama um detetive (Stephen Fry) que mais parece uma paródia de Hercule Poirot. O detetive simplesmente não consegue decifrar nada. Ele é tão inútil que despensa os criados e concentra suas investigações nos magnatas. No fim, o espectador descobre quem cometeu o assassinato (o que é óbvio) através da personagem de Kelly Macdonald. Termina-se o filme sem mistérios, sem punição para os culpados e com todos os personagens indo embora, como se nada tivesse acontecido.
É estranho como um filme tão fraco para o padrão criado fora indicado a tantos prêmios (vencedor do Oscar de Melhor Roteiro Original (?!), BAFTA, vencedor do Globo de Ouro de Melhor Diretor para Robert Altman)!
No fim, vemos que o filme pelo menos funciona como crítica à aristrocracia e aos conflitos sociais, talvez por isso tenha recebido destaque. Há uma crítica clara e objetiva quanto às diferenças sociais, totalmente perceptível e bem debatida através dos diálogos. Mas crítica social, por si só, não sustenta filme de suspense.
Atores mal aproveitados, trama fraca, humor desnecessário e um mistério nada misterioso marcam Assassinato em Gosford Park. Quem gosta dos livros de Christie, como eu, pode até se deliciar com as comparações. Quem gosta do cinema inglês, terá um prato cheio de sotaques, cavalheirismos e situações típicas do cinema britânico. Mas se você espera um mistério intrigante, personagens interessantes ou até mesmo uma boa dose de ação e genialidade, passe longe. O filme não é ruim, isso é claro. Mas poderia ter sido bem melhor.

NOTA MECÂNICA: 6,5

quinta-feira, 27 de dezembro de 2012

O Hobbit: Uma Jornada Inesperada


No início do século XXI estreava nos cinemas a talvez maior franquia cinematográfica desde Star Wars (eu mesmo a considero a melhor de todas), O Senhor dos Anéis. A Sociedade do Anel, primeira parte da franquia, estreara em 2001, seguida de As Duas Torres em 2002 e O Retorno do Rei, em 2003.
Logo, as aventuras do pequeno hobbit Frodo Bolseiro juntamente com os guerreiros da Sociedade do Anel em busca da destruição do Um Anel viraram fenômeno em todo o mundo, criando uma legião de fãs não só dos filmes mas trazendo novos adeptos aos livros de J.R.R. Tolkien, escritor das sagas sobre a Terra-Média.
O Senhor dos Anéis são três livros que fazem parte de tais sagas, mas sempre houve a dúvida do porquê de os estúdios resolverem trazer logo as aventuras de Frodo e companhia para as telonas, quando O Hobbit, livro que conta uma história anterior e que é igualmente bom e épico (considerado por alguns até o melhor de todos) não seria adaptado.
Pois bem. Após Peter Jackson fazer grana, sucesso e conquistar ao todo 17 estatuetas do Oscar com sua trilogia, era hora de Hollywood fazer dinheiro em cima da mesma fórmula. Guilhermo Del Toro foi então chamado para dirigir O Hobbit. Protocolo, trabalhos alheios e questões por aí no entanto, afastaram o diretor de Hellboy ainda na fase do roteiro, e Jackson foi novamente convocado para dirigir essa espécie de epílogo.
Pra quem esperava um filme menor (com a desculpa de que continuações ou ideias "repetidas" dão lixo no cinema) ou até mesmo mais bobo (por conta de O Hobbit ser um livro infantil, que Tolkien escreveu para seus filhos), há de pagar-se algumas línguas. Jackson nos entrega um filme tão épico quanto ou até mesmo melhor que a saga do Um Anel.
Aqui, conta-se a história de Bilbo Bolseiro, tio de Frodo e personagem secundário da primeira trilogia. Jackson trata de fazer as adaptações e apresentações necessárias, até mesmo acrescentando coisas que não estão no livro, tudo para criar uma conexão com a saga passada.
Bilbo (Martin Freeman) é um pacato hobbit que, convocado pelo mago Gandalf (Ian Mckellen) embarca em uma grande aventura atrás de um tesouro guardado pelo dragão Smaug (Benedict Cumberbatch). Em sua companhia, vão os anões  Bofur, Ori, Kili, Fili, Dwalin, Oin, Bombur, Dori, Gloin, Balin, Nori, Bifur e o líder Thorin, Escudo de Carvalho.


Não há tanta coisa a ser observada no filme, podendo ser resumido no seguinte argumento: quem dorme assistindo ou não suporta O Senhor dos Anéis vai sentir o mesmo com O Hobbit. Já quem amou a trilogia inicial, vai ter aqui um prato cheio, tanto pra fãs de Tolkien como para fãs de filmes épicos em geral!
Por ser um livro infantil, O Hobbit não é tão sombrio ou violento como O Senhor dos Anéis, o que dá espaço a momentos musicais muito bem executados e também a piadas a todo o momento, transformando a aventura em algo mais leve e acessível a todos.
Quem não entendia bulhufas de nada sobre a Terra-Média em OSDA, aqui terá mais explicações sobre tudo, visto que esta história vem antes da filmada inicialmente. Aqui há a apresentação de vários personagens das outras sagas, algumas ligações que o próprio Jackson criou, inspirado pelo roteiro de Del Toro.
Os efeitos especiais são um show à parte. Se em OSDA já vemos um esplendor de CGI, aqui em O Hobbit a técnica é muito mais elaborada, e todos os personagens fantasiosos são feitos com qualidade excepcional pela Weta Workshop. Só achei ruim que os orcs outrora interpretados por atores maquiados tenham sido substituídos por atores com captura de movimento, ou seja, digitais.
Outra coisa que também é resultado da evolução tecnológica: os cenários reais não aparecem tanto, dando lugar a muitas paisagens digitais, porém belas.
A câmera usada é novidade e dá um aspecto mais fluído (e ligeiro!) aos personagens. Veja bem: 1 segundo de video, equivale a em média 24 frames (ou "imagens", "fotos", como queira), cada um a centésimos de segundo. Em O Hobbit, são 48 frames por segundo, dando um resultado diferente até mesmo na qualidade da imagem. Note que "diferente" não é sinônimo de "ruim". Logo nos acostumamos e nem reparamos nada de frames, segundos ou coisa do gênero!
Atores excelentes, cenários e efeitos especiais super bem feitos e roteiro coeso são suficientes para criar um grande filme de aventura, mas filme épico que se preze precisa de trilha sonora grandiosa! Todos os filmes da saga passada foram premiados com estatuetas por trilha sonora e com certeza com O Hobbit não será diferente. A trilha sonora é estupenda! As músicas dos anões, o suspense, a magnífica música cantada por Thorin e até mesmo a já conhecida "trilha sonora do Anel" marcam todo o filme, sempre encantando.



No fim, O Hobbit é uma grata surpresa de fim de ano, valeu muito a pena esperar anos pra assistir! Está aí para prestigiar os fãs, atrair os mais novos, marcar a sétima arte e quem sabe ganhar algumas estatuetas? Que venham os próximos filmes dessa nova trilogia preciossssssa!


NOTA MECÂNICA: 9.0