O surrealismo sempre foi uma das mais famosas formas
diversificadas de se expressar artisticamente. Podemos vê-lo principalmente na
pintura e na literatura. Hoje, é incomum vê-lo voluntariamente em um filme,
tirando algumas exceções como Sucker Punch.
Quando pensamos em surrealismo na sétima arte, sempre vem um
curioso filme em mente, O Anjo Exterminador
(1962), de Luis Buñuel. Filme mexicano clássico, é o ápice do surrealismo nas
telonas, um conjunto de situações e códigos aparentemente sem sentido, mas que
podem fazer algum para os mais observadores, criando algo que o próprio Zack
Snyder tentou fazer com seu Sucker Punch citado acima: a possibilidade de
diferentes interpretações, sem uma que seja a verdadeira.
A premissa é aparentemente simples: um grupo da burguesia
aristocrata é convidado para um jantar, logo após a uma ópera. O que acontece,
é que de repente, eles não conseguem mais sair da sala onde estão, simplesmente
parece que não se lembram mais, ficando presos lá. Tem então o início do cair
das máscaras, onde todos, confinados por semanas, começam a mostrar realmente
quem são por trás de tanta etiqueta e postura, revelando seus lados mais
obsuros, desejos e atitudes selvagens, carnais, secretas.
A narrativa não trata de revelar muita coisa não. As coisas
simplesmente... Acontecem. Não sabemos as relações entre os 20 convidados
presentes, não sabemos porque os criados foram embora, e afinal, quem é ou o
que é esse tal de “anjo exterminador”? Por que os convidados ficaram presos? O
surrealismo entra, a mente de Buñuel começa a funcionar, e vemos ali muito mais
do que uma crítica à sociedade: vemos ali um conjunto de mensagens pinceladas
como arte, ponto ápice do surrealismo cinematográfico. No entender do próprio Buñuel, em sua
biografia, ele avalia que o filme é um estudo sobre a vontade: o que faz alguém
caminhar para alguma direção ou mover um braço, por exemplo?
São diversas críticas à sociedade, à política e à Igreja (os
cordeiros andando pela mansão, sendo devorados pelos convidados famintos, a
frase “Sou ateu, graças a Deus”, entre outros exemplos), características de Buñuel,
que sobre o tema, falou: "A moral
burguesa é, para mim, uma imoralidade contra a qual há de se lutar; esta moral
que se baseia em nossas instituições sociais mais injustas como o são a
religião, a pátria, a família e a cultura, em suma, o que se denomina os
pilares da sociedade”.
Durante a película, personagens morrem, brigam, amam-se,
comem papel, abrem um encanamento na falta de água e aparentemente praticam
canibalismo. Entre todos os acontecimentos, pedaços e mais pedaços de
surrealismo jogados aqui e ali, aparentemente sem explicação. Quem aventura-se
a tentar entender a mulher que possui uma pata de galinha na bolsa; a dona da casa
que tem um urso de estimação; homens se comunicando por sinais secretos; a
virgem jogando uma pedra na janela; etc.
O filme é composto por detalhes, que reforçam a crítica à ilusão
em que a sociedade é submersa. Podemos resumir simplesmente analisando a cena
final, burguesia e clero preso numa igreja, o povo apanhando da polícia por
fora e o sino badalando chamando "as ovelhas de deus" para a
sacristia, enquanto o comodismo que prendeu-os novamente assola e reinicia o
ciclo. Verdadeiramente, um filme para poucos, pouquíssimos. Um excelente filme,
nada convencional, que pode impressionar, enojar, enjoar. Uma obra surrealista
crítica, disfarçada de cinema clássico.
NOTA
MECÂNICA: 8,5
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